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Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos 2015



Decorre de 18 a 24 de Janeiro a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos. Fica aqui a introdução ao tema para este ano:
"JESUS DISSE: DÁ-ME DE BEBER"
Jo 4, 7 
1. Quem bebe desta água…
Viagem, sol escaldante, cansaço, sede… “Dá-me de beber!” É um pedido de toda pessoa humana! Deus, que se fez gente em Cristo e se esvazia para compartilhar nossa humanidade (Fl 2, 6-7), é capaz de pedir à mulher samaritana: “Dá-me de beber!” (Jo 4,7). Ao mesmo tempo, esse Deus que vem ao nosso encontro oferece a água viva: “ A água que eu lhe darei se tornará uma fonte que jorrará para a vida eterna.” (Jo 4,14)
O encontro entre Jesus e a mulher samaritana nos convida a experimentar água de um poço diferente e também a oferecer um pouco da nossa própria água. Na diversidade, nos enriquecemos uns aos outros. A Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos é um momento privilegiado para oração, encontro e diálogo. É uma oportunidade para reconhecer a riqueza e o valor que estão presentes no outro, no diferente, e para pedir a Deus o dom da unidade.
“Quem bebe desta água sempre volta” – diz um provérbio brasileiro, utilizado quando uma pessoa que nos visita vai embora. Um copo refrescante de água, chimarrão[1], tereré[2] são sinais de acolhimento, diálogo e convivência. O gesto bíblico de oferecer água a quem chega (Mt 10,42), como forma de acolhida e partilha, é algo que se repete em todas as regiões do Brasil.
O estudo e a meditação propostos neste texto para a Semana de Oração têm o objetivo de ajudar as pessoas e comunidades a perceber a dimensão dialogal do projeto de Jesus, que chamamos de Reino de Deus. O texto afirma a importância de uma pessoa conhecer e compreender sua própria identidade para que a identidade do outro não seja vista como uma ameaça. Se não nos sentimos ameaçados, estaremos capacitados para experimentar o outro como algo complementar: sozinha, uma pessoa ou uma cultura não se basta! Por isso, a  imagem que emerge das palavras “dá-me de beber” é algo que nos fala de complementaridade: beber água do poço de alguém é o primeiro passo para experimentar o modo de ser do outro. Isso leva a uma partilha de dons que nos enriquece. Quando os dons do outro são recusados, há prejuízo para a sociedade e para a Igreja.
No texto de João 4, Jesus é um estrangeiro que chega cansado e com sede. Ele precisa de ajuda e pede água. A mulher está na sua própria terra; o poço pertence a seu povo, à sua tradição. Ela é dona do balde e é ela que tem acesso à água. Mas ela também está com sede. Eles se encontram e esse encontro oferece uma inesperada oportunidade para ambos. Jesus não deixa de ser judeu porque bebeu água oferecida por uma mulher samaritana. A samaritana permanece sendo ela mesma ao acolher o caminho de Jesus. Quando reconhecemos que temos necessidades recíprocas, a complementaridade acontece em nossas vidas de modo mais enriquecedor. Esse “Dá-me de beber” nos impulsiona a reconhecer que pessoas, comunidades, culturas, religiões e etnias precisam umas das outras.
Dizer “Dá-me de beber” supõe que Jesus e a Samaritana se perguntam mutuamente sobre aquilo de que têm necessidade. Dizer “Dá-me de beber”, leva-nos a reconhecer que as pessoas e as populações na sua diversidade, as comunidades, as culturas e as religiões têm necessidade uns dos outros.
“Dá-me de beber” traz consigo uma ação ética que reconhece a necessidade que temos uns dos outros na vivência da missão da Igreja. É algo que nos impele a mudar nossa atitude, a nos comprometer com a busca da unidade no meio de nossa diversidade, através de nossa abertura para uma variedade de formas de oração e espiritualidade cristã.
2. O contexto eclesial e religioso do Brasil
O Brasil pode ser considerado um país muito religioso. É tradicionalmente conhecido como um país em que uma certa “cordialidade” caracteriza as relações entre classes sociais e grupos étnicos. No entanto, o Brasil está vivendo um tempo de crescente intolerância manifestada em altos níveis de violência, especialmente contra minorias e os mais vulneráveis: pessoas negras. Jovens, homossexuais, praticantes de religiões afro-brasileiras, mulheres e indígenas. Essa intolerância esteve escondida por muito tempo. Tornou-se mais explícita e revelou um Brasil diferente quando, em 12 de outubro de 1995, na festa de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do país, um dos bispos de uma Igreja neo-pentecostal chutou uma estátua de Nossa Senhora Aparecida durante uma apresentação de nível nacional na TV. Desde então, temos tido outros incidentes de intolerância religiosa a partir de grupos cristãos. Tem havido também situações similares de intolerância cristã em relação a outras religiões, particularmente quando se trata de tradições indígenas e afro-brasileiras.
A lógica que está por baixo desse tipo de comportamento é a competição pelo mercado religioso. De modo crescente, no Brasil, alguns grupos cristãos adotam uma atitude competitiva de uns com os outros: é uma competição por um lugar na comunicação de massa, por novos membros e fundos públicos para grandes eventos. O papa Francisco aponta para esse mesmo fenômeno quando escreve: “O mundanismo espiritual leva alguns cristãos a estar em guerra  com outros cristãos que se interpõem na sua busca pelo poder, prestígio, prazer ou segurança econômica.” (Evangelii Gaudium, 98)
Essa situação de competição religiosa tem afetado a vida tradicional das confissões cristãs, que têm experimentado uma redução ou estagnação no número de seus membros. Isso tem impulsionado a idéia de que uma Igreja forte e dinâmica é uma Igreja que tem um número elevado de membros. Como resultado, há uma tendência no meio de setores significativos de Igrejas tradicionais de afastamento da busca da unidade visível da Igreja cristã.
Essa cristandade voltada para o mercado investe em políticas partidárias e, em alguns casos, cria seus próprios partidos políticos. Tem se alinhado com interesses específicos de grupos, como o dos latifundiários, os ligados ao agro-negócio e aos mercados financeiros. Alguns observadores chegam a falar que há uma força confessional na vida política, que ameaça a separação entre o Estado e a religião. Assim, a lógica ecumênica da derrubada das paredes da divisão é substituída por uma lógica “corporativista” e pela proteção de interesses de algumas denominações.
Embora o Censo oficial de 2010 mostre que 86,8% dos brasileiros se identificam como cristãos, o país tem taxas bem altas de violência. Assim, a alta percentagem de filiação cristã não parece se traduzir em atitudes não violentas e respeito pela dignidade humana. Essa afirmação pode ser ilustrada pelos seguintes dados:
Violência contra as mulheres – entre 2000 e 2010, 43.700 mulheres foram assassinadas no Brasil. Quarenta e uma por cento dessas mulheres que sofrem violência são violentadas em suas próprias casas.
Violência contra povos indígenas – a violência contra a população indígena freqüentemente está relacionada com o desenvolvimento de hidroelétricas e a expansão do agro-negócio. Esses dois projetos expressam o modelo de desenvolvimento que prevalece hoje no país. Eles contribuem significativamente para a lentidão nos processos de demarcação e reconhecimento de territórios indígenas. Em 2011, o relatório “Violência contra povos indígenas no Brasil”, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), um organismo ligado à Conferência de Bispos da Igreja Católica do Brasil, identificou 450 projetos econômicos a serem desenvolvidos em terras indígenas no Brasil. Esses projetos acontecem sem a adequada consulta aos povos indígenas, que está prevista na Convenção 189 da Organização Internacional do Trabalho. O relatório da CPT denuncia o assassinato de 500 indígenas entre 2003 e 2011; 62,7% dessas mortes aconteceram no estado de Mato Grosso do Sul. A média anual de assassinatos é de 55,8 indígenas.
A dominante intolerância, em suas variadas formas, deveria ser enfrentada de maneira positiva: respeitando a legítima diversidade e promovendo o diálogo como um caminho permanente de reconciliação e paz, como fidelidade ao evangelho.
3.    Opção hermenêutica
A metodologia adotada pelo CEBI, e largamente posta em prática na América Latina, é chamada de Leitura Contextual da Bíblia. Trata-se de uma abordagem do texto que é, ao mesmo tempo, acadêmica e popular. Nessa metodologia, o ponto de partida para qualquer teologia e interpretação bíblica é a vida cotidiana. Adotamos a abordagem que vemos em Jesus no caminho de Emaús (cf Lc 24,13-24): Que está acontecendo? De que vocês estão falando? Partindo do contexto, vamos ao texto bíblico. Nessa viagem metodológica, a Bíblia é uma lâmpada para os nossos pés, uma luz para o nosso caminho (Sl 119,105). Tomamos a Bíblia como um raio de luz a iluminar o caminho de nossas vidas. O texto bíblico nos ensina e nos transforma para que possamos dar testemunho da vontade de Deus no contexto em que vivemos.
4.    A caminhada através dos dias
A caminhada que estamos propondo para os oito dias começa com uma proclamação, que conduz a denúncia, renúncia e testemunho. A Semana começa com a proclamação de um Deus que nos criou à sua própria imagem, que é a imagem do Deus Triuno, unidade na diversidade. A diversidade é parte do plano de Deus. A seguir, algumas situações de pecado que levam à injustiça são denunciadas. Em terceiro lugar, a renúncia a essas atitudes pecaminosas que levam à exclusão se apresenta como um passo na direção da unidade do Reino de Deus. Finalmente, damos testemunho da gratuidade de Deus, que está sempre disposto a nos acolher apesar de nossa imperfeição, com seu Santo Espírito nos animando na direção da reconciliação e da unidade. Assim vivemos a experiência de Pentecostes, com os múltiplos dons do Espírito que levam a tornar realidade o Reino de Deus.

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